Quando meu filho nasceu, após sete dias na UTI Neonatal foi
direto para meu local de trabalho comigo.
Nas coxias de teatros meu filho conheceu os mais variados
tipos de pessoas, passou por todos os tipos de colos, e teve todo o cuidado que
elencos grandes poderiam dar. Qualquer resmungo e lá estava alguém que havia
ficado fora da cena vendo o que a “mascote” da equipe precisava.
Consequentemente meu filho cresceu tendo por brinquedos objetos
de meninas e meninas, pois vivia com acessórios cênicos nas mãos. Para ele, era
absolutamente normal minha discussão com o pai dele que havia pego meu
delineador emprestado e esquecera de devolver. Isso, porque a maquiagem nada
mais era do que um instrumento de trabalho do pai dele, e da mãe também, e que
nunca foi fator predominante para definir nosso gênero e menos ainda opções e
comportamentos sexuais.
Nos primeiros anos, meu filho se perdia em meio aos nossos
pincéis de maquiagem, e testava cores em nossos rostos. Sempre teve talento
para desenho, e isso se refletia nas caracterizações que criava em nós, daquele
jeito peculiar que uma criança faz.
Um dia, seu pai e eu nos separamos, nas voltas que a vida
dá. Mudei de cidade, e meu filho mudou o lugar onde ficava. Ele que nunca foi
proibido de ficar entre as meninas brincando, agora tinha restrições. E mesmo
que eu dissesse que era contra este comportamento, que acreditava que todos
eram iguais, a resposta que tinha era de que meu filho poderia entender o mundo
do jeito que ele quisesse, mas que havia coisas de homens e coisas de mulher.
Junto com sua irmã, ficou por quatro anos aos cuidados de uma família mais
conservadora enquanto eu trabalhava. E em nenhum momento vi isso como algo
negativo: meu filho precisava entender a diversidade. Precisava entender que
havia locais onde pessoas pensavam de uma maneira diferente e ele devia
respeitá-las da mesma maneira que desejava ser respeitado. Meu filho nunca foi
maltratado neste lugar, mas presenciou meninos acreditando que provavam sua
masculinidade lutando entre si não brincando com meninas. E presenciou também
meninas que acreditavam comprovar sua feminilidade costurando e demonstrando
timidez nos “bailinhos” promovidos pela família. E justamente por presenciar “coisas
de homem” passou a praticá-las.
Perguntei há pouco tempo se queria testar maquiagens em mim.
Ouvi um não bem redondo. “Mas tu sempre gostou”, retruquei. “Não gosto mais”,
ele respondeu sem jeito.
Não ia insistir. Minha filha discretamente cochichou para
mim que havia visto seu irmão falando que isso era coisa de bicha, veado, gay.
E que ele não era gay. E mesmo assim deixei a confusão acontecer. Meu filho
precisava entender e lidar com a rejeição de algo que gostava por causa de
possíveis rótulos.
Passei a mostrar que nada tinha de gay um homem usar
maquiagem. Ele entendeu. Fiz um esforço verdadeiro para que meu filho agisse
como achava melhor.
Parecia uma busca incessante por uma identidade original
dele. Um dia me perguntaram no trabalho: “Mas e se ele for gay? Tu quer um
filho gay”?
Nunca quis um filho gay. Nunca, de verdade. Ensino ao meu
filho, que agora termina sua educação moral exclusivamente em casa, pois já tem
13 anos; que ele pode dizer não para uma menina quando quiser. Quando me refiro
a um futuro onde ele terá uma casa e uma família, nunca uso a palavra esposa.
Falo pessoa: a “pessoa que viver ao teu lado”. Ensino a ele artes e outras
delicadezas. Costurar, cozinhar, limpar. Ensino tudo junto à sua irmã: além
disso tudo que falei, planejamento de carreira, educação financeira, defesa
pessoal e comportamento social.
Ensino tudo isso, porque nunca quis um filho gay. Nem uma
filha lésbica. Isso porque não é um direito meu modelá-los neste sentido. Não é
meu direito de mãe torná-los homo ou heterossexuais. Para mim, de que importa o
gênero da pessoa que meus filhos escolherem para compartilhar a vida, ou apenas
a cama? O que me importa é a integridade física, mental e moral deles. E isto
independe do sexo que vierem a praticar, desde que haja respeito, educação,
cuidado e conhecimento. É isso que quero. E amor de mãe, meus amigos, é uma “doença”. E não tem cura. Ao contrário da homossexualidade, que também não
tem cura, mas não é uma doença.
Nunca quis um filho gay. Só quis filhos completos, sejam eles
como forem; e isso é um direito deles.
![]() |
Imagem extraída do Google |
Realmente fantástico.
ResponderExcluirObrigada, Gabi. Tu acompanha de perto esta história.
Excluir