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quinta-feira, 9 de abril de 2015

Era uma vez O Sul



- Pois tu sabes que até agora não caiu a ficha?

- Então, já era sabido que a crise do impresso tinha chegado naquelas paragens.

- É... Há que se adequar.

- Mercado maldito este!

- Mas criatura, este mercado não vai acabar. Lembra daquela frase clichê: “a comunicação nunca vai acabar... ela só vai mudar de plataforma”? É assim. Tem que virar multimídia, e...

- Ah, eu vou morrer de fome! Mal sei programar uma câmera digital doméstica!

- Então, cara! Vai fazer um curso, estudar.

- Estudar? Tu acha mesmo que eu preciso estudar? Minha escola é a vida, meu filho! É a estrada. Há quantos anos tu achas que eu reporto daqui da minha cadeirinha? Não tenho mais condições de fazer estas loucuras! Tempos bons aqueles que a gente perseguia bandido e vinha correndo pra redação bater os dedos na Olivetti. Uma lauda, um cigarro, uma lauda, um cigarro. Depois era o bar da esquina e um monte de cerveja. Bons tempos.

- Mas as pessoas não querem mais saber o que já aconteceu! Eles querem saber o que acontece na hora!

- Que escutem rádio.

- Tu estás andando em looping.

- Todos nós estamos. Vamos todos ficar desempregados mesmo, com esta enxurrada de crianças que pensam que sabem escrever só porque recebem um monte de curtidas e coments. Uma verdadeira vergonha!

(...)

- Ainda não caiu a ficha.

- Que ficha, rapaz? Nem vai cair! Isto é um absurdo! Onde já se viu? Depois estamos todos com nariz de palhaço gritando nas ruas e ninguém sabe por que! Pouca vergonha! Acham que podem se livrar assim da gente?

- E eu me peguei pensando nos impressores...

- Ah, eles que vão trabalhar numa gráfica!


-Oi?





terça-feira, 7 de abril de 2015

Dizem que hoje é dia do Jornalista



Hoje, dizem que é dia do Jornalista.

Na verdade, vivo este dia todos os dias.

Assim como em todas as profissões, nos comprometemos antes com o mundo, para depois nos comprometermos com si mesmos.

E como isto é gigantesco, às vezes assustador.

Existem pessoas que pensam que existimos apenas em matérias assinadas em folhetins pela TV, Rádio, Televisão. Que existimos quando damos nosso "boa noite", ou quando anunciamos "notícia de última hora", ou ainda quando escrevemos aquela coluna apimentada na página de opinião. Ledo engano. Existimos nas madrugadas, nas ameaças de quem quer fazer algo escondido, nos momentos em que as imagens são tão fortes e intoleráveis que nos prestamos a vê-las primeiro e proteger nosso expectador de um possível choque.

Existimos também fora das redações, garantindo que seja lá qual for a informação que o expectador queira receber; que ela seja recebida de maneira eficaz, digna e ágil. E não é trabalho fácil.

Existimos formando outros Jornalistas. Pois aquilo que se faz primordialmente necessário para a sociedade precisa de continuidade.

Há algum tempo temos ultrapassado as linhas do romantismo e não nos afixamos em uma mesa com nossos cigarros, café, máquina de escrever: dividimo-nos entre a vastidão da informação, nossas famílias, nossos desejos, nossa saúde. E como a tarefa de mantermos nossa saúde tem sido cada vez mais árdua! Como a linha entre a perda da nossa humanidade, da nossa compaixão, do nosso respeito aos nossos anseios e o caráter de nosso compromisso é tênue!

Mesmo que não estejamos em alguma área de risco fazendo uma cobertura, ficamos com o coração apertado nas mãos esperando nossos colegas voltarem da Faixa de Gaza, do Morro do Alemão, das manifestações populares do Brasil. E fazemos o possível para dar suporte para que ele se mantenha vivo e cumpra a sagrada missão de informar. E é com quase incuportável dor e sensação de impotência que acompanhamos quando temos uma baixa em nossas equipes. Mesmo que esta baixa tenha ocorrido em outra emissora, outro grupo de comunicação, ou outro país. Mesmo que seja um único colega que tenha sofrido com a falha em um colete a prova de balas. Mesmo que tenha sido um único colega atingido por uma bomba pelas costas. Mesmo que tenha sido um único colega torturado por um grupo de intolerantes. Mesmo que tenha sido uma redação inteira vitimada por um atentado. Dependemos um do outro diariamente; e mesmo que não nos falemos ou não nos conhecemos pessoalmente erguemos nossos lápis muitas vezes quebrados e informamos o que acoteceu, numa incansável tentativa de evitar uma lamentável repetição dos fatos.

Pensamos em conteúdo, pensamos em educação, pensamos em cultura, pensamos na verdade acima de tudo (mesmo que precisemos ouvir cada lado dela, mesmo que intragável).

Fizemos um juramento no dia em que tomamos a decisão de nos doarmos desta forma. Que o mundo permita que ele possa ser cumprido todos os dias. Mesmo com todas as dificuldades. Com toda a honra e amor a que nos propomos.

“Juro / exercer a função de jornalista / assumindo o compromisso / com a verdade e a informação. / Atuarei dentro dos princípios universais/ de justiça e democracia,/ garantindo principalmente / o direito do cidadão à informação. / Buscarei o aprimoramento / das relações humanas e sociais,/ através da crítica e análise da sociedade,/ visando um futuro/ mais digno e mais justo/ para todos os cidadãos brasileiros./ Assim eu Juro”.

Assim eu juro. E juramentos para mim são vitalícios, quando não possivelmente eternos.

Feliz dia do Jornalista.